25º Aniversário do Pontificado de João Paulo II

Alocução do Bispo do Porto, na celebração do Te Deum, Domingo, 19 de Outubro, na Sé Catedral do Porto Meus caros fiéis: Reunidos em oração de louvor, damos graças a Deus pelos 25 anos de Pontificado do Papa João Paulo II. Nascido em Cracóvia em 16 de Maio de 1920, no rescaldo de uma guerra que tanto afligiu a Polónia, o Cardeal Karol Wojtyla foi eleito Bispo de Roma e Sumo Pontífice pelo Colégio dos Cardeais, em 16 de Outubro de 1978. Homem temperado e robustecido pelo sacrifício, pelo trabalho e pelo desporto, o nosso Papa, vindo de leste com surpresa, iniciava um Pontificado que se adivinhava longo e que, apesar dos acidentes de uma saúde contrariada e ferida, acaba de atingir uma duração invulgar ao perfazer 25 anos de actividade e abundantes frutos. As celebrações e festas jubilares sucedem-se e excedem-se no zelo de fazer a festa maior, mais original, e mais condigna, com a comunicação social a esforçar-se por retirar do seu património o melhor de cada memória, de cada imagem, de cada pensamento, de cada programa, para entrar na festa que também deseja sua e para abrilhantar a festa, despertar a inteligência e aquecer o coração de multidões distraídas ou adormecidas. A Igreja, à qual preside o Papa, Bispo de Roma, está neste momento desperta para a unidade, para a colegialidade afectiva e efectiva, e para a comunhão que a caracteriza e define. E verificamos, com admiração e sereno entusiasmo, que o Jubileu do Papa motiva e cria sentimentos de comunhão mais vasta, universal e católica. Na Exortação Apostólica pós-Sinodal, que o Papa acaba de nos enviar, com a data precisamente do dia jubilar , 16 de Outubro de 2003, e que trata do “Bispo, servidor do Evangelho de Jesus Cristo para a Esperança do Mundo”, lê-se: “Desde os primeiros séculos, a referência suprema da comunhão é a Igreja de Roma, onde Pedro e Paulo deram o seu testemunho de fé. Com ela, pela sua posição mais excelente, deve necessariamente estar de acordo toda a Igreja, porque isso é a garantia última de integridade da tradição transmitida pelos Apóstolos. De facto, a Igreja de Roma preside à comunhão universal da caridade, tutela as legítimas diversidades e ao mesmo tempo vigia para que as particularidades sirvam a unidade e de forma alguma a prejudiquem”(n.º 57). É por isso que aqui estamos e aqui viemos, numa manifestação de simpatia, de respeito, de fé e comunhão, para na festa que fazemos e para fazermos festa, louvamos a Deus pela vida, pelo dom que é a pessoa de João Paulo II, e para evocarmos à nossa maneira alguns momentos, actividades, atitudes e obras do Papa. O património doutrinal que nos legou já divide-se entre documentos assinados em Roma (“dados em Roma, junto de S. Pedro”), e intervenções inúmeras durante as 102 visitas apostólicas internacionais e as 143 visitas em território italiano. Numas e noutras o Papa abordou e tratou problemas correntes da Igreja, das igrejas, dos cristãos e das populações em geral, e enfrentou os problemas e temas mais quentes da vida social, política, ética e religiosa do nosso tempo e do nosso mundo. Bastaria lembrar os temas tratados nas assembleias ordinárias e extraordinárias dos Sínodos que convocou e a que presidiu, examinar as respectivas Exortações pós – sinodais; os problemas da vida de que sempre foi defensor acérrimo, mesmo tendo de combater só; os problemas da saúde, nomeadamente na sua dimensão ética, da biologia e da bio-ética; a defesa da família à base do projecto revelado de Deus e à luz do evangelho e da melhor tradição cristã; o conjunto dos direitos humanos: a apologia e defesa das crianças, o carinho com os idosos e doentes, a doutrina social da Igreja, as mensagens de paz e as intervenções em favor da paz (mesmo quando a guerra parece inevitável, o Papa não deixa de proclamar que a paz é possível – contra spem in spem credidit – acredita na paz e no seu coração projecta a paz mesmo quando todos se precipitam para a guerra. Tem aversão à guerra: Guerra, nunca mais…). Levantando-se contra a lógica da guerra, entra em comunhão e faz comunhão contra o terrorismo. Pouco se deixando influenciar pelo peso das maiorias, acede facilmente ao consenso universal (pelo menos da parte mais sã) contra o terrorismo. Acima de tudo é pela pessoa humana, pelos seus direitos, pela paz fraterna e universal. Os jovens são uma das suas paixões. Não porque o Papa o afirme, como é costume nos lugares ou momentos de demagogia, mas porque são os jovens que se apaixonam pelo Papa. Convocados para os grandes encontros internacionais, deslocam-se e acorrem indiferentes a dificuldades e sacrifícios até de heroicidade. Se lhes perguntamos porquê, só conseguem dizer que se sentem chamados, convocados, felizes, quase beatificados. Conservamos as imagens do Papa a dialogar com as multidões de jovens, a cantar com eles, a dar o tom dos cânticos que escolhe. Os jovens são e sentem que são a esperança que enche o coração do Papa e preenche grande parte dos seus documentos e apelos. A Igreja está marcada pela abertura e universalidade de João Paulo II. A doutrina do Ecumenismo, a insistência no Ecumenismo, as atitudes concretas de Ecumenismo, o diálogo inter-religioso, o encontro amigo, verdadeiro e leal com o outro, com os outros, de qualquer etnia, cultura ou religião (Constantinopla, Roma/Sinagoga, Jerusalém, Muro das Lamentações e Mesquita, Londres, Assis) são sinais fortes e indeléveis da abertura e universalidade que exornam o Papa e que ele sempre desejou imprimir na Igreja. Há uma questão que se formula numa pergunta que será porventura mais elucidativa que a resposta: O Papa João Paulo II não é também um político? Não é um político? Temos consciência de que em 1989 foi derrubado o muro de Berlim. Era um escândalo em confronto com a desejada unidade da Europa. O Papa consagrou a própria terminologia que classifica aquele facto de que ele mesmo foi sem dúvida protagonista: “Os acontecimentos de 1989…”. Em 24 de Outubro de 1964 Paulo VI, no Mosteiro restaurado de Monte Cassino, proclamou S. Bento Padroeiro da Europa. Chamava a atenção para as raízes cristãs da Europa e para o necessário ideal da unidade espiritual da Europa. E em 1982 João Paulo II clamava em S. Tiago de Compostela: “Europa, volta a encontrar-te. Sê tu mesma. Descobre as tuas origens. Aviva as tuas raízes. Revive aqueles valores autênticos que tornaram gloriosa a tua história e benéfica a tua presença nos outros Continentes. Reconstrói a tua unidade espiritual num clima de respeito às outras religiões e às genuínas liberdades”. Este discurso europeísta, repetido no mesmo lugar em 1989, diz bem da vontade do Papa e do que pensa sobre as origens e história da Europa, sem esquecer toda a sua mensagem sobre o respeito pelas outras religiões e pelas “genuínas liberdades”. De resto, exactamente pelas mesmas razões de implantação da Igreja em esforço de unidade europeia, o mesmo João Paulo II em 1980 tinha proclamado Padroeiros da Europa, a par de S. Bento, os Santos Cirilo e Metódio, homens do leste europeu no século IX. Assim, se podem entender os apelos repetidos do Papa para que a Constituição Europeia não esqueça e não omita uma referência às suas origens cristãs. Parece que as liberdades não genuínas apostam em abandonar o Papa a clamar num deserto manipulado, embora o “Osservatore Romano”, órgão político e religioso do Vaticano, mantenha vivo o apelo do Papa em afirmação diária de testemunho em forma de slogan: “A Europa ou é cristã ou não é Europa”. O Papa neste tempo: Consciente da missão que Cristo lhe confiou e que exerce com serenidade e coragem, João Paulo II disse-nos no início deste IIIº milénio da era cristã: “No início do novo milénio… ressoam no nosso coração as palavras com que um dia Jesus, depois de ter falado às multidões a partir da barca de Simão, convidou o Apóstolo a “fazer-se ao largo” para a pesca: “Duc in altum” (Lc. 5,4) (Novo millennio ineunte, nº1). E advertiu-nos: “O nosso passo tem de fazer-se mais lesto para percorrer as estradas do mundo” (Ibid, nº 58). Em 28 de Junho do ano corrente publicava uma Exortação Apostólica sobre “A Igreja na Europa”. Lembrava-nos que na Europa de hoje há um certo ofuscamento da esperança, ao lado da nostalgia da esperança e de manifestos sinais de esperança. Dizia e insistia: Jesus Cristo é a nossa Esperança, é a fonte de toda a Esperança. Este sentimento de Esperança é um dos dons mais característicos de João Paulo II, um dom que ele mesmo tem que agradecer a Deus, e que a nós compete também agradecer – por ele e por nós. A nossa homenagem ao Papa, hoje, é a participação festiva num jubileu em que de João Paulo II foram e estão a ser lembradas virtudes, actividades, benefícios para a igreja e para o mundo, e também porventura defeitos, resistências, não cedências doutrinais… Sabem-se do Papa muitas coisas, incluindo muitos segredos. Permito-me, porventura com presunção nem grave nem ferida de exclusividade, indicar o segredo da sua vida, santidade e exemplaridade: Em 16 de Outubro de 2002 João Paulo II publicou uma Carta Apostólica – “Rosarium Virginis Mariae”, para introduzir o Ano do Rosário no início do vigésimo quinto ano do seu Pontificado. Depois de nos contar a história da sua devoção à Mãe de Deus, escreve: “ Com estas palavras, meus caros Irmãos e Irmãs, inseria no ritmo quotidiano do Rosário o meu primeiro ano de Pontificado. Hoje, no início do vigésimo quinto ano de serviço como Sucessor de Pedro, desejo fazer o mesmo. Quantas graças recebi nestes anos da Virgem Santa através do Rosário: Magnificat anima mea Dominum! Desejo elevar ao Senhor o meu agradecimento com as palavras da sua Mãe Santíssima, sob cuja protecção coloquei o meu ministério petrino: Totus tuus!” (nº2). E termina com uma oração à Senhora do Rosário de Pompeia: “Seja para ti o último beijo da vida que se apaga… Sede bendita em todo o lado, hoje e sempre, na terra e no céu”. (n.º 43). Isto escreveu o Papa há um ano, no início do 25º ano do Pontificado que agora celebramos, neste final do Ano do Rosário. Entretanto o Papa foi recentemente à sua terra natal, e esteve num santuário mariano que lhe é querido e familiar. E pediu a Maria para lhe dar coragem e força até ao fim. E no dia 7 de Outubro foi a Pompeia coroar as celebrações do Ano do Rosário no Santuário de Nossa Senhora do Rosário. Que a Senhora lhe dê força e coragem para que continue a ser para nós um exemplo de fidelidade, de perseverança e de amor ao serviço da Salvação da Humanidade. Sé Catedral do Porto, 19 de Outubro de 2003 + Armindo Lopes Coelho, Bispo do Porto

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