Conferência de imprensa no voo de regresso a Roma

O Papa Francisco falou com os jornalistas durante cerca de meia hora, no voo entre Monte Real e Roma. A Agência ECCLESIA, que acompanhou a viagem, apresenta as suas respostas às perguntas diretamente relacionadas com a peregrinação a Fátima

Santo Padre, veio a Fátima como peregrino para canonizar Francisco e Jacinta no ano em que se completam 100 anos das aparições. Desse ponto de vista histórico, que fica agora para a Igreja e o mundo? Depois, Fátima tem uma mensagem de paz e o Santo padre vai receber no Vaticano, nos próximos dias (24 de maio) o presidente norte-americano Donald Trump. Que pode esperar o mundo deste encontro e o que espera o Santo Padre? Obrigado.

Papa Francisco: Fátima tem certamente uma mensagem de paz, levada à humanidade por três grandes comunicadores que tinham menos de 13 anos, o que é interessante. Vim como um peregrino, sim. A canonização foi algo que no início não estava programado, porque o processo do milagre estava em andamento, mas de repente as perícias foram todas positivas e acelerou-se, as coisas aceleraram. Para mim foi uma felicidade muito grande.

O que é que o mundo pode esperar? Paz. De que vou falar eu, daqui para a frente, seja com quem for? Da Paz.

E o que fica agora deste momento histórica para a Igreja e o mundo?

Papa Francisco: Mensagem de paz. Gostaria de dizer uma coisa que me tocou o coração. Antes de embarcar, recebi cientistas de várias religiões que estavam a fazer investigações no Observatório [Astronómico] Vaticano de Castel Gandolgo. Incluindo agnósticos e ateus. E um ateu disse-me: “Eu sou ateu” – não me disse de que etnia nem de que lugar vinha, falava em inglês, de modo que não soube nem perguntei. “Eu peço-lhe um favor: diga aos cristãos que amem mais os muçulmanos”. Esta é uma mensagem de paz.

 

Santidade, em Fátima apresentou-se como o ‘bispo vestido de branco’. Até agora, esta expressão aplicava-se antes de mais à visão da terceira parte do segredo, a São João Paulo II e aos mártires do século XX. O que significa agora a sua identificação com esta expressão?

Papa Francisco: Sim, na oração. Não fui eu quem a compôs, foi o Santuário, mas também me perguntei: porque é que disseram isto?

Há uma ligação ao branco: o bispo vestido de branco, a Senhora de branco, a alvura branca da inocência das crianças após o Batismo. Há uma ligação, nessa oração, à cor branca. Penso – porque não fui eu quem a fez – penso que, literariamente, procuraram exprimir com o branco o desejo de inocência, de paz: de inocência, de não fazer ao mal aos outros, não fazer guerra.

A oração, essa, não a fiz eu, fê-la o Santuário.

 

Há uma revisão da interpretação da mensagem?

Papa Francisco: Não. Essa visão… Penso que o então cardeal Ratzinger, na altura prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé (2000) explicou tudo claramente. Obrigado.

 

Hoje é o Centenário das Aparições de Nossa Senhora de Fátima, mas é também um aniversário de um facto da sua vida, acontecido há 25 anos, quando o núncio Calabresi lhe disse que iria ser bispo auxiliar de Buenos Aires, o que significou o fim do seu exílio em Córdoba e uma grande mudança na sua vida. A pergunta é: alguma vez ligou este facto, que mudou a sua vida, com Nossa Senhora de Fátima? E nestes dias, em que rezou diante dela, pensou nisto, o que é que nos pode contar? Obrigado.

Papa Francisco: As mulheres sabem tudo, ah? Não tinha pensado na coincidência, apenas ontem (sexta-feira), enquanto rezava diante de Nossa Senhora, me lembrei que a 13 de maio recebi esse telefonema do núncio, há 25 anos. Sim, não sei, disse: “Olha”… Falei um pouco com Nossa Senhora sobre isto, pedi desculpa pelos meus erros, também algum mau gosto para escolher pessoas. Mas ontem lembrei-me disso.

 

Em Portugal, quase todos os portugueses identificam-se como católicos, quase todos, quase 90%, mas a forma como a sociedade se organiza, as decisões, muitas vezes são contrárias às orientações da Igreja. Refiro-me ao casamento entre homossexuais, a despenalização do aborto. Agora vamos começar a discutir a eutanásia. Como vê isto?

Papa Francisco: Eu penso que é um problema político e que também a consciência católica não é uma consciência, às vezes, de pertença total à Igreja; por trás disto não há uma catequese variada, uma catequese humana, ou seja, o catecismo da Igreja Católica é um exemplo do que é uma coisa variada, séria. Penso que também é falta de formação e também de cultura.

Porque é curioso: nalgumas outras religiões, penso também na Itália, algumas da América Latina – que… são muito católicos, mas são anticlericais, os ‘mangiapreti’ que (risos)… É um fenómeno que acontece.

 

E isso preocupa-o?

Papa Francisco: Claro que me preocupa. Por isso digo aos sacerdotes – já o terão lido: fujam do clericalismo. Porque o clericalismo afasta as pessoas. Fujam do clericalismo, e acrescento, é uma peste na Igreja. Mas aqui o trabalho também é de catequese, de consciencialização, de diálogo, inclusive de valores humanos. Obrigado. Agradeço-lhes muitíssimo o trabalho e a perspicácia das perguntas. Obrigado. E não se esqueçam de rezar por mim.

 

 

 

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