Homilia do bispo de Santarém na Missa Vespertina da Ceia do Senhor


Irmãos e irmãs

Com esta Missa da Ceia do Senhor, comemoramos a instituição da Eucaristia, o Sacerdócio ministerial e o Mandamento novo da caridade, deixado por Jesus aos seus Apóstolos. Com esta Celebração damos início ao Tríduo Pascal, origem e fonte de todas as solenidades litúrgicas ao longo do ano.

 

Jesus celebra a Ceia com os seus discípulos.

Seguindo a tradição familiar do seu povo, Jesus celebra a Ceia com os seus Apóstolos em intimidade. Por isso, a nossa Eucaristia, embora aconteça numa igreja de portas abertas, deve permitir esta experiência de intimidade dos discípulos com Jesus.  Participar conscientemente numa missa, é participar na intimidade da Ceia do Senhor.

Celebração da Nova e eterna Aliança, a Ceia do Senhor é Memorial do que vai acontecer de seguida: a sua paixão, morte e ressurreição. A corresponder ao espírito da primeira Leitura, é a Ceia que tem força de Memorial a celebrar pelo tempo adiante, assegurada pela tradição da Igreja, até que o Senhor volte, como ensina S. Paulo.

Irmãos e irmãs

A Eucaristia é a celebração da vitória do Amor que nos purifica e nos retoma na verdade da existência, sem ilusões nem frustrações. É “Fonte e centro de toda a vida cristã”. Para ela  convergimos, nela nos alimentamos e dela partimos para a missão da vida. É a ‘obra prima’ do Senhor que retomamos e atualizamos sempre que nos reunimos em seu nome para esse efeito.

A Eucaristia rompe com o nosso isolamento e abre-nos para o relacionamento com Deus e com os irmãos. É mistério de comunhão invisível com o Senhor, mas também sinal visível de fraternidade em assembleia celebrante.

 

Jesus dá início ao ministério sacerdotal quando ordena aos seus Apóstolos “Fazei isto em memória de Mim”. Hoje é dia de considerarmos e rezarmos pelos nossos sacerdotes, os nossos padres, e manifestar-lhe apreço pelo dom de Deus que eles são para Igreja. Rezarmos pela sua fidelidade e pela sua realização humana na missão pastoral que lhes é confiada.

O Senhor Jesus constituiu-nos a todos como um povo sacerdotal, um povo que lhe pertence, um povo consagrado a Deus e ao bem. Um povo que tem ao seu serviço, trabalhadores para tornarem presente Cristo pela Palavra, pela Eucaristia e demais sacramentos, e pela consequente promoção da prática da Caridade, como extensão e testemunho de tudo o que acreditamos e celebramos. Apreciadores deste dom, rezemos pelos nossos padres e por aqueles que o Senhor quer chamar para este ministério.

 

Também nesta celebração temos a Promulgação do Mandamento Novo,  a Caridade fraterna.  

Não por acaso, o apóstolo e evangelista S. João em vez das palavras da narração da aliança, descreve o Lava Pés; um episódio que traduz o mistério pascal: dar a vida, servindo a humanidade purificando-a; o Amor traduzido em doação e serviço, sem ambições de poder.

 

O cristão é exortado a amar a Deus no seu próximo e a amar o seu próximo em Deus.  Perante uma sociedade marcada por inimizades e conflitos, egoísmos e injustiças, os cristãos celebram a Eucaristia; acreditam que é possível o Amor porque nesta fonte, experimentam a graça da caridade divina que se traduz em perdão e motivação de edificar a vida e o mundo na justiça e na paz.

 

Quem celebra a Eucaristia está a identificar-se com Cristo nesta disposição de amor e serviço. A celebração da Eucaristia pede compromisso! A transubstanciação do pão e do vinho no Corpo e no sangue de Cristo, sugere e pede compromisso na transformação do mundo.

 

Disponhamo-nos a que o Senhor Jesus nos lave os pés; um gesto que revela com que humildade o Senhor nos ama. E revela também que o Senhor não quer de nós apenas palavras e discursos, mas uma vida marcada por este mesmo espírito, pondo em prática o Mandamento Novo do Amor.

 

O Lava pés revela o novo rosto de Deus: no lugar da imagem do Deus todo poderoso e dominador, Jesus revela-nos um Deus que se põe de joelhos a lavar os pés à sua criatura. É uma imagem desconcertante que leva o Apóstolo Pedro a rejeitar por entender que estão invertidas as funções. Aceitou pois só assim podia manter-se unido a Cristo; mais tarde, havia de compreender que a sua missão de Apóstolo é de doação e serviço, e não de ilusões de poder.  

“Jesus ‘amou-nos até ao fim’ (Jo 13,1). Com estas palavras, o evangelista introduz o gesto de infinita humildade que Ele realizou: na vigília da sua morte por nós, na cruz, pôs uma toalha à cintura e lavou os pés aos seus discípulos. Do mesmo modo, no sacramento eucarístico, Jesus continua a amar-nos ‘até ao fim’, até ao dom do seu Corpo e do seu Sangue. Que enlevo se deve ter apoderado do coração dos discípulos à vista dos gestos e das palavras do Senhor durante aquela Ceia! Que maravilha deve suscitar, também no nosso coração, o mistério eucarístico!” (Papa Bento XVI, in Sacramentum Caritatis, 1)

 

Irmãos e irmãs, que a celebração pascal nos leve a viver a compaixão do Senhor por tantas situações humanas que necessitam de pés lavados; nos ajude a retomar o novo estilo de Jesus de viver a vida: o respeito pela vontade do Pai e a entrega decidida pela promoção e valorização da pessoa humana, seja qual for a sua fragilidade ou dependência.

Nas Bodas de Caná, Nossa Senhora instruiu os servidores das mesas: “fazei o que Ele vos disser”. E o que Jesus nos diz hoje é: “Fazei isto em minha memória”; “Vós chamais-me Mestre e Senhor…. Se Eu vos lavei os pés, sendo Senhor e Mestre, também vós deveis lavar os pés uns aos outros”. Que esse gesto que fazemos nesta Liturgia, seja uma oportunidade para nos responsabilizar uns pelos outros e pelo mundo, em santidade e justiça.

D. José Traquina, bispo de Santarém

 

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