Igreja/Trabalho: Bispo do Porto insurge-se contra processo de despedimento coletivo que envolve corticeira de Santa Maria da Feira

«O lucro não é tudo» nem pode valer para «espezinhar a dignidade humana e os direitos sociais», frisa D. Manuel Linda

Manifestação dos trabalhadores da corticeira. Foto: Lusa

Lisboa, 05 dez 2018 (Ecclesia) – O bispo do Porto saiu em defesa dos direitos de dezenas de trabalhadores de uma multinacional ligada ao setor da cortiça, em Santa Maria da Feira, que enfrentam neste momento a perspetiva de despedimento.

Numa mensagem divulgada pelo site diocesano, D. Manuel Linda realça que “o lucro não é tudo” nem pode valer para “espezinhar a dignidade humana e os direitos sociais”.

“Um exemplo: na área da nossa Diocese, instalou-se uma multinacional que adquiriu uma fábrica que já estava em laboração há muitos anos. Esta fábrica, seguia o tradicional horário das 8 às 18. Mas a compradora, que não conhece as pessoas nem com elas se importa, pretende passar ao sistema de laboração contínua, por turnos, incluindo o sábado e o domingo. Durante todo o dia e toda a noite. E não precisa minimamente disso, pois dedica-se a um setor normalíssimo e sem especiais exigências técnicas”, pode ler-se.

Embora D. Manuel Linda não cite explicitamente a situação, em causa está a empresa Pietec, que justifica o despedimento coletivo com a atual conjuntura negativa do mercado, e com a intenção de encerrar alguns setores da sua atividade, nomeadamente a produção de rolhas de macrogranulado e de rolhas de disco.

O objetivo da administração da multinacional é passar a privilegiar a produção de rolhas de microgranulado, e alterar também o seu regime horário para a laboração contínua, por turnos, incluindo sábados e domingos.

A reestruturação dos recursos humanos, nomeadamente com o despedimento de 38 trabalhadores, está relacionada com a extinção de postos de trabalho mas também com a implementação de técnicas mais modernas de produção.

A empresa Pietec deixa a porta aberta para os trabalhadores abrangidos conservarem os seus vínculos de trabalho, mediante um eventual acordo que permita transitarem para a unidade de produção de rolhas de microgranulado.

Diante desta posição, pelo menos três funcionários já aceitaram alterar o seu contrato de forma a manterem os seus postos de trabalho.

Para D. Manuel Linda, esta atitude só tem como base “tomar o pulso dos trabalhadores para depois “provavelmente, todo o setor passar a esse regime”, de produção contínua, já que esta opção “é mais lucrativa”.

O bispo do Porto lamenta que os Ministérios da Economia e do Trabalho tenham acedido às pretensões da empresa e alerta para todas as mudanças que esta alteração repentina de procedimentos vai implicar para os trabalhadores, nomeadamente ao nível da vida familiar.

Foto: D. Manuel Linda, bispo do Porto, DR

Segundo D. Manuel Linda, a “qualidade de vida dos trabalhadores” não pode ser colocada em causa devido à “ganância da entidade patronal”.

O prelado faz menção também àquilo que a Igreja Católica defende quanto à preservação do “domingo”, que é não só um dia de “descanso”, mas também um “marco insubstituível da religião para o avanço civilizacional”.

“Não. Uma consciência católica não pode aceitar este modelo económico que, tal como o juiz iníquo da parábola, ‘nem teme a Deus nem respeita a pessoa’”, conclui.

A situação dos trabalhadores na corticeira Pietec, em Santa Maria da Feira, motivou também uma carta do Sindicato dos Operários Corticeiros do Norte ao presidente da República Portuguesa.

No documento, aquele organismo requer a Marcelo Rebelo de Sousa que trave o processo de despedimento coletivo, que a empresa Pietec pretende iniciar no próximo sábado.

“O tempo urge, a partir de 8 de dezembro começa a concretizar-se o despedimento para os trabalhadores mais antigos e temos casais e trabalhadoras com filhos pequenos que não podem ter a mãe no desemprego ou a trabalhar à noite. Que Natal espera estes homens e mulheres?”, questiona o sindicato.

JCP/OC

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