Quando assumir um “sim” para sempre?

Miguel Oliveira Panão (Professor Universitário), Blog & Autor

Hoje, 14 de fevereiro, dia dos namorados, penso que uma longa vida a dois é um projecto que começa no namoro. Porém, na cultura actual temos a percepção de que a idade daqueles decidem casar é cada vez maior. Pode ser a falta de independência financeira, ou segurança no trabalho, ou a busca do outro-perfeito até perceber que não existe e o melhor é avançar com o outro-imperfeito.
Mas serão as imperfeições e limites impedimentos para assumir um compromisso como o matrimónio? Quando é que sabemos que estamos em condições de assumir um dizer “sim” ao outro-imperfeito para sempre? “Para sempre”, uma ideia actual ou ultrapassada?
Não deixa de ser curioso que o dia dos namorados seja este ano celebrado no mesmo dia em que se inicia o período da Quaresma com a Quarta-feira de Cinzas. As três palavras chave deste dia são o jejum, a oração e a esmola. Penso que os dias podem relacionar-se e das palavras-chave fazer a experiência daquilo que nos ajuda a perceber quando dizer o “sim” que pode levar ao matrimónio.

O essencial

Quando pensamos em jejum (e abstinência) pensamos naquilo que comer e abster, mas é muito mais do que isso. Jejuar é viver no essencial. Quanto ruído existe no mundo de hoje, e quanto supérfluo gera uma cultura do descartável, como falou o Papa Francisco. Viver no essencial é dar espaço ao que realmente importa na nossa vida.
O essencial para dizer um “sim” para sempre é o querer de estar com o outro 24 sobre 24h, de tal modo que os dois possuem um desejo incondicional de dar-se totalmente. Não temporariamente, ou mediante determinadas condições. Não é preciso ter tudo, mas ao menos a coragem de arriscar e confiar. Um estar ou viver juntos é insuficiente quando o essencial é o amor incondicional no compromisso assumido a dois perante Deus e os outros, onde o matrimónio é a sua expressão mais visível.

O diálogo

Se orar é procurar este espaço de relacionamento com Deus em tudo o que fazemos, não há melhor forma de o fazer a dois do que no diálogo. Uma dinâmica de reciprocidade onde faço um vazio em mim para dar espaço à ideia, emoção e experiência do outro, e o outro faz o mesmo comigo.
O alimento que mais nutre uma vida a dois para sempre é o diálogo. Pois, acima daquilo que é necessário resolver, no diálogo experimentamos a verdade que é necessária viver. No diálogo sincero e genuíno estamos reciprocamente vulneráveis porque nos expomos com palavras, expressões, lágrimas, risos, ou simples sorrisos. E é nessa vulnerabilidade que encontramos a força que tem dizer “sim” ao outro para sempre.

O dom

A etimologia da palavra esmola na sua origem grega é compaixão. Logo, como o sentido desta palavra foi-se alterando com o tempo, o seu significado de “sofrer com” foi dando lugar ao “ter pena de”. Porém, enquanto dizemos “ter compaixão”, e faz sentido, não dizemos “ter esmola”, mas “dar esmola”. Isto aponta para a característica de **dom** que tem esta palavra quaresmal. Porém, um dar de quem se faz-um com o sofrimento do outro. E isso faz-me pensar nas suas imperfeições e limites, bem como na incerteza daquilo que virá depois de um “sim” para sempre.
De acordo com a socióloga Brené Brown, a compaixão é uma das virtudes da  imperfeição, diz ela – **”no centro da compaixão está a aceitação.”** O outro será sempre imperfeito, mas se na sua imperfeição se dá a ti totalmente, então, faz-se dom para ti e como é importante aceitá-lo.
Depois, o outro tem limites antes do “sim” e conhecerei outros depois do “sim”, mas não são os limites que nos impelem a ser criativos para os ultrapassar? E se essa criatividade não for um exercício do amor em relação ao outro, então, será muito difícil fazer algo criativo. Ao contrário do que pensamos, os limites do outro e os teus estão repletos de potencialidade. Ora, apesar da incerteza de cada dia, os limites podem tornar-se a potência que dá um impulso perene a uma longa e criativa vida a dois.
Não há uma receita para o momento em que os dois decidem assumir um “sim” para sempre e marcar a data. Por vezes temos mesmo de nos lançar na aventura do amor e transformar os limites em possibilidades.
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